13 outubro 2014

Gosto de ti...

Era uma relação de repugnância. Ela não suportava café. Todas as vezes que o fazia por dever ou servia por obrigação jurava cheia de convicção que nunca o tomaria.
O aroma lhe trazia náuseas. O aspecto era insuportável. Mas não tinha opção,  todos que a rodeavam eram apreciadores daquela bebida. Tomavam como se fosse água. Usavam-na como se fosse essencial. Dependiam dela como do ar.
Ele não tomava leite. Aquela substância líquida, branca, gordurosa o enjoava. Não por opção, mas o corpo dele o rejeitava de tal forma que qualquer reaproximação era traumática.
Desde pequeno sofrera com isso. Ele, que adorava aquele cheiro, não podia conviver com ele. Era uma tortura qualquer convívio social onde comida fizesse parte do cardápio. O leite sempre se fazia presente.
Se esbarraram por aí, nesses acasos da vida. Nada programado. Tudo sincronizado. E resolveram se desafiar.
Deitaram na mesma cama, olho no olho e ali se fixaram.
Correram dias a fio até o primeiro sinal de cansaço o fizeram pegar um café. A resistência dela foi fraquejando e o cheiro começou a lhe parecer interessante. Hesitou, mas a vontade de permanecer com os olhos abertos foi mais forte. Cedeu. Tomou o temido café. O desafio continuava.
Já era tarde. O frio gelava cada centímetro de roupa e congelava cada pedaço de pele. Ela não aguentou e providenciou um leite tão quente, que ainda se viam as bolhas da fervura. O branco aveludado fazia-o delicioso. Quando se deu conta, ele já havia dado o primeiro gole. Ao mesmo tempo que o leite aqueceu o corpo, o pensamento gelou. Nada aconteceu. Não houveram reações bizarras, adversas, inconvenientes. Algo havia mudado.
Dias e dias se passaram num desafio sem fim. Cada um fraquejava nalgum momento, os dois se reerguiam ao mesmo tempo. Mergulharam num esforço contínuo de se superar, detonando qualquer sentido da razão de estar ali. Apenas estavam e permaneciam.
Houve um rompante de repente que os tirou da estranha situação. Como se tivessem combinado, sem qualquer palavra escolhida, se viraram. Deram uma dúzia de passo em direções opostas. E olharam para trás. Se admiraram mais alguns instantes antes de desaparecerem nas suas vidas.
O tempo lhes foi traiçoeiro diversas vezes e quase parecendo um menino teimoso, os fez reencontrar numa variedade boa de momentos.
Junto às vidas já estavam marcadas de experiências. Os desafios tornaram-se cansativos e perdiam a conta deles. E inverteram os papéis.
O café se tornou-se inseparável para ela. O leite se tornou o vício dele. Juntos vivem nesse eterno café-com-leite.

Um comentário:

Codinome disse...

parabéns, gostei!!!!!! vou fazer uma revisãozinha de texto......hehehee