22 janeiro 2015

Companhia...

Elas lhe lembravam um mundo que já não tinha. Não sabia por mais quanto tempo. A única certeza que existia é que a saudade era cruel com ela. O tempo lhe havia ensinado muito bem isso.
Aqueles pontos violetas... Ou roxos, talvez rosas... Mas aqueles pontos de cor que ela não havia definida qual era, lhe traziam breves suspiros de um bom sentimento. Elas eram a tradução do mais simples, porém complexo demais para se entender com a mente. Só a alma compreendia.
O verde lhe dava a esperança de ter tudo de volta, o que tinha sido apenas por um  breve momento, por um tempo sem limite, sem datas, sem definição.
Revolveu-lhes a terra para que se nutrissem melhor, como se esse fato a alimentasse também. Talvez, a saciasse duma fome de não estar só. Firmou as raízes, e se sentiu segura. Estava na frente das suas companheiras, a quem confiara desejos e segredos, lágrimas e sorrisos. E elas lhe retribuíam com bons pensamentos, pequenas lembranças e doloridas reflexões. Assim viviam dia após dia. Não buscavam nada. Apenas se queriam bem.
As pequenas tinham sede, diferente da sede dela, que se resolvia com algumas gotas de água, caindo suave como chuva de verão. A dela... Não havia fórmula certa de saciar. Experimentara muitas opções, algumas surtiram efeito, outras nem tanto. Assim ela fazia de cada dia uma experiência por realizar, e à noite confidenciava às pequenas flores do seu jardim.

16 janeiro 2015

Pela noite...

Tarde da noite o sono não lhe vinha. Os barulhos da rua eram poucos, um carro que passara, um caminhar apressado, movimentos de algum vizinho mais desastrado que as paredes finas denunciavam, o caminhão do lixo fazendo seu trabalho. Ela olhava para a janela, fixamente, vendo os insetos voadores rodopiarem em torno do poste de luz. A rua era apenas iluminada por aquele feixe de luz. O resto era breu. Foi quando suspirou. Foi o único som que se ouviu naquele instante. Todo o resto estava silencioso. A sua casa não tinha nenhuma outra alma se não a dela.
Deitou, no intuito de conseguir ao menos descansar seus olhos, já que sua mente trabalhava incansavelmente em algo que ela não entendia. Tentativa frustrada. Foi quando percebeu que o teto de casa era verde. Observou, examinou e refletiu durante horas o motivo disso. O que fazia alguém pintar um teto de verde? Sentiu enorme vontade de rabiscá-lo. Ao menos naquele pedaço que ficava em cima da sua cama. Haveria alguma tinta escondida pela casa, pensava ela sem a intenção de se levantar para procurar.
Piscou... Por instantes se entregou ao cansaço. Mas a volta à insônia foi rápida. Porém diferente. Ela saiu da cama determinada. Arrumou a casa como há tempos não fazia. Deixou cada coisa em seu lugar, ajeitou aquele velho lustre torto que ela não gostava, devolveu à sala o jarro de flores que detestava, guardou todas as toalhas no armário. Limpou cada canto com muito detalhe. A casa nunca estivera tão limpa. Tudo ficou em perfeita harmonia, mais do que o dia em que ela se mudara.
Ela chegou de mala e mochila. Entrou pela porta de casa e suspirou ter um teto, não importasse a cor. Sentou-se no sofá e ficou horas admirando sua nova varanda. Não era a casa dos sonhos, mas era real. E era o que importava naquele momento. Ali ela montou seus planos, sua vida. Aos poucos ia tirando seus pertences da mala. Tirava, colocava de volta, tirava novamente. Aos poucos já suas coisas já mesclavam a paisagem da casa. A casa foi sendo sua. E ela da casa. Ali amava, chorava, conversava e dormia. A cozinha tinha seus temperos, o quarto seus cheiros. O tempo assim passava por ela, ela pela casa e a casa pela vida.
Agora ela descobrira o teto verde numa noite de insônia. Ao se lembrar disso, depois de se dar por satisfeita com a limpeza, resolveu fazer as malas. Guardou todas roupas, embrulhou o que era desnecessário ao dia-a-dia, lacrou o que não usava. E sentou em cima da mala preta, ao terminá-la de fechar. Olhou à sua volta e suspirou. Estava tudo pronto.
Tudo limpo, ajeitado, feito. Poderia partir a qualquer momento. Largar tudo, esquecer, reviver. Não estava nos planos dela. Mas porque não? Não tinha um porquê, não havia um sequer motivo para uma fuga assim. Mas ela se sentia confortável com aquilo. Poder sair quando quisesse lhe dava sensação de total liberdade.
Circulou pela casa toda e conferiu tudo. Olhou para as malas. Conferiu se a porta estava trancada. Observou os primeiros raios de sol da janela do seu quarto. E adormeceu confortavelmente na sua cama.

11 janeiro 2015

Jogo de tarde

E foi com um grito de gol que ele conseguiu seu companheiro de jogo. 
Entrou tímido em território estranho é meio sem jeito perambulou com olhar examinador o que lhe rodeava. 
Sem conseguir fazer uma aproximação amiga aceitou a ideia de alguém mais velho poderia ser seu goleiro. 
Por volta do seu quinto chute acertou em cheio a cadeira como baliza improvisada. E gritou! Gritou um "GOOOL" bem gritado, digno de jogador bem treinado, que conquistou seu maior objetivo momentâneo. Pareceu cena de final de campeonato com direito a abraço ao goleiro rival. 
Foi resultado dessa comemoração, que já ele se ia preparando para o próximo chute, que lá veio o companheiro para fazer gol junto.

Como se fosse hoje...

Lembro do nosso encontro como se tivesse sido hoje. Talvez porque tenha mesmo sido e o tempo que houve até agora me fez sentir uma eternidade. Mas não. Já faz tempo que senti teus braços me envolverem de tal forma, que num misto de desespero e aconchego, desejei nunca mais me soltares. 
Lembro daquele beijo tímido, indeciso e rápido dar a certeza de que queria mais. E também o quiseste, se não os próximos não teriam sido tão intensos e demorados como foram. Teu sorriso, ali à minha espreita, fecho os olhos e o vejo em primeiro, segundo, terceiro e todos os planos possíveis no cinema. Como era suave, ansioso, delicado e encantador. Somados aos teus olhos, irresistível. Não tinha como negar tudo isso. Nem com o coração mais gélido seria possível tamanha insensatez. 
Teu perfume, teu corpo, teu afeto, teu jeito... Química perfeita. Teria fórmula primária melhor que essa? 
Lembro de cada detalhe como se tivesse sido hoje. Não foi. Sinto como se fosse, e o imagino para matar saudades.