19 novembro 2013
O carvalho
Começou a passar por entre as ruínas das casas de pedra. Dava para sentir o que se tinha vivido ali, o que era cada pedaço de terra, a melancolia pairava no ar. A cada centena de metros percorridos ela entrava nos pensamentos dele. No meio, ele se lembrava da traição que os mantinha distantes.
Encontravam-se todos os dias debaixo do velho carvalho, sob sol e chuva. Mas os dias nublados eram os seus favoritos. Ela chegava com seus olhos baixos, contaminada pelo cinza do céu, colocando todas as angústias para fora, querendo um colo acalentador. O desafio dele era devolver-lhe o sorriso ao semblante que se encontrava triste. Sempre conseguia, seja pelas palavras bobas ou com conversas sem fim. Depois, apenas se despediam como se não houvesse amanhã. Até o dia que não existiu.
Ele recebera uma carta, escrita com trêmula letra e borrada com pequenas lágrimas, dizendo adeus. Ela resolveu explorar o mundo - sozinha. Deixou-o para trás como quem jogava fora uma casca de banana. E não mais apareceu. Frustado, continuou indo ao carvalho manhã após manhã, na esperança de um engano. Viu a frondosa árvore morrer de desamor e foi neste momento que desistiu. Ela o traira e esse era o fim.
Continuou até ao cimo do monte admirando os frutos amarelos que nasciam nas pequenas árvores da subida. Pareciam não aguentar o peso deles, mas permaneciam firmes suportando cada fardo. Ao longe avistou os galhos secos do carvalho. Nele um vulto de um cão aproveitando o pouco sol confortável daquela tarde. Aproximou-se no intuito de resgatar algum bom pensamento daquele lugar.
E lá estava ele, envolto no fumo do seu cigarro, sentindo o ar fresco, sonhando acordado com os dias que nunca existiram, onde era possível sentir o cheiro dos cabelos dela, ouvir o riso e acalmar os prantos. Se deliciou com os carinhos que ela lhe fazia. Pareciam tão reais.
Foi quando percebeu que ela estava lá. Apareceu-lhe silenciosamente e envolveu-o carinhosamente. O tabaco havia acabado. Puderam olhar fundo um para o outro na esperança dos olhos contarem o que ninguém sabia. Gelaram. A noite chegou num bruto sopro e a lua iluminou os dois corpos imóveis, juntos, calados, de mãos dadas no topo da pequena vila. Assim ficaram por dias e dias até os lábios se unirem. Nesse instante uniu-se tudo.
Conta-se que moram numa casa de pedras, começam os dias no antigo carvalho, adormecem ao pé da lareira ouvindo o rio passar...
11 novembro 2013
Aperto
Neste peito apertado
Se espalha de tal jeito
Pela alma espalhado
Tem um coração
Neste sonho acordado
Não sabe se ri ou se chora
Só se sente apertado
Aperto, desaperta
Fica num cantinho só
Bem depressa e de mansinho
Some logo e sem dó.
15 setembro 2013
As flores de uma vida
O perfume dos jasmins-do-cabo davam um toque aveludado ao seu mundo.
A cada dia um girassol brilhava de manhã. A cada noite uma dama marcava a sua presença com seu cheiro. Nos dias frios, amores-perfeitos acolhiam-na em suas pétalas amorosas. E no calor intenso, chuvas-de-prata a refrescava.
Queria mergulhar num campo de alfazema para se perfumar. Suas roupas de lírios e coroas de pascoalinas a cobriam. E rosas carmim adornavam.
Meditava com uma lótus tranquila.
Sonhava com a liberdade dos cravos.
E vivia no paraíso das flores...
05 setembro 2013
09 agosto 2013
Transparente
Do alto ele a observava, porém com os olhos não a via.
Ela o sentia enquanto escrevia, lia e vivia. Conversava com ele sem ser ouvida. Mas ele entercedia por tudo que ela pedia.
De longe ela lhe mandava presentes que ele nunca podera tocar. A certeza que ele os aceitava era certa. Ele retribuia de formas sublimes.
Ela o vira certas vezes. Estava ali mesmo sem estar. Era saudade ia e vinha. Vinha e ia. Ia e vinha...
08 agosto 2013
Caneta tinteiro
Ele escrevia. E ela só observava.
Com aquela letra pequena e com uma definição artística os espaços eram preenchidos com qualquer que fosse o conjunto de letras. As palavras eram quadros que compunham um museu de recados. E ela admirava cada exposição compenetrada.
Contida na caneta, a tinta preta, quase como sagrada para a escrita, ia para o papel com fluidez tal qual rio que corta silenciosamente a vegetação fechada. Apenas corre e nada mais. Ela tentava imitar. Mas o cuidado que ele tinha era impecável, já as mãos delas contavam a história oposta. Sua pele ficava tingida e nos papéis borrões não se liam. Era boa aquela sensação.
Nas folhas registradas, assinaturas bem marcadas, como céu em noite de lua sorridente. Uma escultura miúda com muito para contar. Quantas canetas puderam ouvir? Ela nunca conseguiu reproduzir. Só restava gostar.
A paixão da caneta passou por osmose. A tinta corre agora por outros veios. Ela escreve...
Ele não mais.
04 julho 2013
Pé de acerola
Num movimento sutil, começou a esticar-se para alcançar a acerola que mais lhe parecia vermelha. Quanto mais madura, mais saborosa seria E ela sabia disso. Alcançá-la era difícil, mas valia a pena o esforço.
Aos poucos, com a pontinha dos seus delicados dedos, conseguiu tocá-la. Apanhou-a firme, sem apertar para não esmagá-la. E contemplou-a. Naquele momento como que se fundiram numa só coisa. Não se sabia mais onde terminava a pequena menina e começava a grande acerola. Eis que de repente se ouve um suspiro de satisfação, quase que um grito de alegria, um gemido de emoção.
Ela mordeu a frutinha! E o resto evaporou. O sabor era intenso demais para o mundo existir à sua volta...
E ela acordou. Se levantou e correu para a sua vida diária. A imagem não lhe saía do pensamento, mas o gosto não existia na sua boca. Parou tudo e apenas tomou um suco de acerola.
30 junho 2013
Operação
Tempos antes haviam juntos saído num bom passeio pelos seus sonhos. Nem repararam na neblina de grude que se encontrava pelo caminho. Distraídos, seguiram em frente, riam e falavam, sorriam e andavam sem dar conta das horas passadas. O grude secou e assim ficaram colados. Agora era necessário operar.
Entraram passivos, serenos e tranquilos na sala de operações. Deitaram no efeito da anestesia, com um sorriso bobo estampado em cada face. Viajaram para os mais longíquos pensamentos... Preciso o cirurgião passa o bisturi calmamente. Separa-os sem dó, nem caridade. Eles nem sentem. O corte certeiro, a sutura cuidadosa, o curativo perfeito. Eles apenas dormem.
Operação terminada e cada um é levado em uma maca. Cada um para o seu quarto, em cada extremo do hospital. Sairão cada um por uma porta, seguirá cada um o seu caminho, tentará cada um a sua rotina. Mas sonhará cada um o mesmo sonho.
Maldito cirurgião que se esqueceu de separar o firmamento! Aquele em que nas estrelas se unem os sentimentos, onde as almas são coladas e os pensamentos sentidos por si só. Agora não há mais solução dissolvedora. Apenas o tempo da ilusão enterrará a poeira de cola deixada para trás... E assim será.
31 maio 2013
A primeira vez nunca se esquece
Até certo momento, em que as palavras ditas sem verdade começaram a pesar. Nas conversas a história se enroscava mais, tomava caminhos desconhecidos por onde ninguém queria andar.
A verdade simplesm cm dó ela resolveu revelar, Era um detalhe tão pequeno, tão risonho, tão lindo, que havia sido coberto com podridão. Foi onde ela errou. Mas quis concertar. Porém agora era tarde...
Mandei-a embora, com o meu coração dilacerado. Perdeu tudo, o pouco que tinha. Não a julgava. Entendia seu medo, seu amor, seu sofrer. Mas não podia mais abraçá-la. Não assim, não ali, não eu.
Ela se foi...
Foi a primeira vez que despedi.
30 maio 2013
Amor
Amar é repreensão, carinho, aconchego
É chorar, tropeçar e animar
Amor é solidão, alegria, sonhar
É estar presente. É ser ausente.
Amar é esperar, levar, unir
É sofrer, guiar e ficar.
Amor é silêncio, abraço, olhar
É um beijo. É uma mão.
Amar é dedicação, sair, paciência
É justiça, sabedoria e imaginação.
Amor é ser sentido.
É ser amado. É ser vivido.
Apenas amar.
22 abril 2013
Vivendo
leitura saudosa que acalma.
Sonhar o futuro, querer um sentido
seguir sempre em frente, sentir arrepio.
Olhar sempre atento, caminhar sempre firme.
Sorrir e cantar e vencer desafios.
Ponto de partida
Ali chegaram, chegaste e cheguei um dia.
Partidas eternas, temporárias ou duvidosas.
Chegadas esperadas, surpresas, demoradas.
Partidas sem fim, Chegadas ao fim.
Tudo está diferente, Continua tudo o mesmo.
Dali parti para te ver partir. Ali cheguei depois de teres chegado.
Aqui fiquei e tu foste. Para aqui vim e tu ficaste.
21 abril 2013
A bichinha da saudade
Bichinha teimosa, adora se esconder, desaparecer, se escafeder...
Mas por breves momentos, até que resolve aparecer.
Na vida ela brinca de esconde-esconde, junto com os sorrisos e adeus.
Junto com as lágrimas e até logo. Saudade vai embora logo!
08 janeiro 2013
E assim chorei...
Saudades de ti.
Estavas longe, mas estavas aqui.
Era só te ligar.
Às vezes eras tu que ligavas. Era só te escrever.
E tu escrevias. Falavas.
Agora só me resta sempre rezar...
para esta saudade matar.